Poucos temas mexem tanto com a opinião pública brasileira quanto a expansão do agronegócio. Em Mato Grosso, mega-colheitas de soja, milho e algodão transformaram antigas fronteiras agrícolas em polos de riqueza, mas também trouxeram perguntas incômodas sobre desmatamento, uso de água e desigualdade social.
Um grupo de pesquisadores da Fundação Getulio Vargas (FGV/EESP) e da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” da USP (Esalq-USP) acaba de propor uma resposta numérica a essa questão. Eles apresentam um “Índice de Sustentabilidade do Desenvolvimento Rural” (ISD) para avaliar, município a município, o equilíbrio entre lucro, bem-estar e conservação em 141 cidades mato-grossenses. Os resultados mostram um retrato revelador, e por vezes surpreendente, da realidade no coração agrícola do Brasil.
O agronegócio responde por 26 % do PIB de Mato Grosso e garante alimentos para o mundo, mas é também alvo de críticas devido a desmatamento, conflitos de terra e uso intensivo de agroquímicos. Sem métricas confiáveis, políticas públicas acabam guiadas por percepções ou interesses setoriais, dificultando conciliar produção e preservação.
Ao criar um índice único, os autores buscam três objetivos: comparar realidades distintas dentro do estado, identificar gargalos específicos (sejam sociais ou ambientais) e orientar investimentos e ações corretivas. A lógica é simples: só merece o selo de “sustentável” quem vai bem nos três pilares ao mesmo tempo, econômico, social e ambiental.
Para chegar ao ISD, o estudo combinou sete indicadores obtidos em bases oficiais como IBGE, Atlas Brasil e ANA. Cada indicador foi normalizado de 0 a 1 e depois convertido por um modelo matemático que garante pesos equilibrados entre extremos, inspirado na razão áurea.
Os dois indicadores de cada pilar foram integrados em sub-índices econômicos e sociais; já o bloco ambiental reuniu três variáveis. Por fim, a raiz cúbica do produto desses três sub-índices gerou o ISD para cada município.
Os resultados revelam um “corredor verde-amarelo” de alta sustentabilidade cortando o centro de Mato Grosso. Cidades como Sapezal, Primavera do Leste e Lucas do Rio Verde ostentam ISD acima de 0,68: combinam agronegócio pujante, bons indicadores sociais e relativa conformidade ambiental.
Já nos extremos norte e sudoeste surgem bolsões de vulnerabilidade, onde renda e serviços públicos são baixos e déficits ambientais permanecem altos, mesmo quando há grandes reservas indígenas que mascaram ivos em propriedades privadas.
Essas disparidades trazem reflexões importantes. Primeiro, crescimento econômico não garante, por si só, inclusão social nem floresta em pé. Segundo, métricas ambientais baseadas apenas em área protegida podem esconder problemas locais, como restauração obrigatória que não saiu do papel.
Para o leitor, fica a lição: sustentabilidade não é um conceito abstrato, mas um conjunto mensurável de escolhas diárias, do crédito rural às compras do supermercado. Quando indicadores claros entram em cena, o debate sai do campo das opiniões e ganha números que falam por si.
A Sustainability Index for Agrarian Expansion: A Case Study in Mato Grosso (Brazil). 5 de junho, 2025. Graebin AC, Weise C, Reichardt K, Neto DD.